quinta-feira, 26 de julho de 2012

O cinema de Werner Herzog, segundo Lúcia Nagib

Por Wanderley Andrade


“Quantas cores há num gramado para o bebê que engatinha, ainda não consciente do verde?” A frase  de um dos principais expoentes do New American Cinema, Stan Brakhage, traduz muito bem, mesmo que de forma figurada, a essência do trabalho de Herzog. O olhar virgem, a busca pelo novo, por imagens nunca vistas irão acompanhar grande parte de seus filmes. E é nesse contexto que Lúcia Nagib vai basear seu livro Werner Herzog, O Cinema como Realidade.
Lúcia Nagib nasceu em São Paulo no ano de 1956. Na época em que escreveu o citado livro, era assessora da Cinemateca Brasileira e crítica de cinema e literatura da Folha de São Paulo. Traduziu para o português um dos livros de Herzog, Caminhando no Gelo.
Em Werner Herzog, O Cinema como Realidade, Lúcia conta, a princípio, um pouco da história do cineasta alemão. Werner Herzog passou sua infância nas montanhas do interior bávaro, quase que isolado da vida urbana, tanto que veio falar ao telefone pela primeira vez aos quinze anos. Apesar disso, em entrevista dada à autora, afirmou “não ter qualquer experiência rural ou de relação direta com a terra”.
Mais adiante somos apresentados a um Herzog experimentalista. Seus trabalhos iniciais serviram de laboratório para o que viria pela frente. O cineasta alemão produziu alguns curtas e médias-metragens entre 1965 e 1970. Entre eles, Lúcia destaca o Últimas Palavras, curta-metragem rodado nas ilhas de Creta e Sinalonga, na Grécia, que mostra alguns personagens imóveis diante da câmera repetindo as mesmas frases ininterruptamente. Em seus trabalhos iniciais a repetição é um fator predominante, tanto das imagens, como também dos sons.
O primeiro longa de Herzog foi Hércules, feito entre 1962 e 1965, que mostra halterofilistas exibindo suas musculaturas durante seus treinamentos. Mas dentre os primeiros longas realizados por Herzog, destacam-se Fata Morgana e Os Anões também começaram pequenos. São filmes nos quais o cineasta explorou ao máximo sua criatividade e originalidade, fugindo assim do lugar comum das produções comerciais.

Herzog e a miragem

Começa o filme. Na primeira cena, um avião pousa lentamente. Quando, enfim, consegue tocar o solo, a cena é cortada de forma brusca. Através do mesmo enquadramento, presenciamos outro pouso, tão “rápido” quanto o anterior. A aeronave toca a pista e, mais uma vez a cena é cortada. Para desespero do espectador, surge outro avião. Enfim, ao todo, a situação se repete oito vezes. Este é Fata Morgana, um entre tantos outros filmes polêmicos de Werner Herzog.
Lançado em 1970, é um misto de documentário e ficção. Seu título significa miragem. Na verdade, algumas cenas do filme parecem grandes miragens. A princípio, Herzog queria rodar uma ficção científica, mas ao iniciar as filmagens, jogou fora o roteiro. Literalmente. O filme não tem um enredo definido, fugindo assim à estrutura narrativa. Segundo Lúcia Nagib, Fata Morgana se destina, pelo menos num primeiro momento, à fruição sensível, como a que exige a execução de uma peça musical. Diante disso, o uso da imagem aliada à música é essencial na obtenção do efeito desejado.
O filme é dividido em três partes: Criação, Paraíso e A Idade de Ouro. Ele é narrado por Lotte Eisner, uma cineasta alemã pela qual Herzog nutria na época grande admiração.

Influencia romântica e brasileira

Segundo Lúcia Nagib, Herzog é considerado o cineasta mais romântico da nova geração do cinema alemão, pois retomou obras do auge do romantismo daquele país. Seu filme mais conhecido, O Enigma de Kaspar Hauser, é um bom exemplo disso. Ele foi inspirado no livro de Anselm Von Feuerbach, feito em 1832, que relata a história do Jovem Kaspar. Apesar da postura romântica ser uma característica da juventude, Herzog procura desmistificar a idéia não abrindo, na maioria de suas histórias, espaço para personagens jovens.
A obra de Herzog também sofreu influencia do cinema brasileiro. O Cinema Novo nos anos 60, com os filmes dos cineastas Ruy Guerra e Glauber Rocha, serviram de inspiração para o alemão. A busca por uma identidade, a luta contra o conformismo e a descoberta da própria realidade, foram pontos em comum compartilhados pelos cineastas dos dois países. A admiração pelos brasileiros foi tamanha que Herzog convidou Ruy Guerra para desempenhar um papel de destaque em Aguirre (1972).

Participação de Ruy Guerra no filme Aguirre (1972)

Entrevista com o cineasta

Mais adiante, Lúcia apresenta a entrevista que realizou com Herzog no dia 05 de maio de 1986. Nela, o cineasta revela detalhes de sua infância, fala sobre seu contato com a natureza, além da paixão pelos esportes, inclusive o futebol. Fala de sua atitude em relação à crítica de cinema e também de sua amizade com Glauber Rocha.

Enfim, este é o Herzog apresentado por Lúcia Nagib. Concluo o texto com uma de suas frases proferida  durante a entrevista, que o retrata muito bem:

Eu não sou nenhum artista, sou alguém que trabalha, isto é, arte não existe no meu caso, apenas trabalho”.

Trailers:

Referência bibliográfica     
NAGIB, Lúcia. Werner Herzog: O Cinema como Realidade / Lúcia Nagib. – São Paulo: Estação Liberdade, 1991.

Psicologia da comunicação: Houldine Nascimento; Wanderley Andrade 

Nenhum comentário:

Postar um comentário