“Quantas cores há num gramado para
o bebê que engatinha, ainda não consciente do verde?”
A frase de um dos principais expoentes
do New American Cinema, Stan
Brakhage, traduz muito bem, mesmo que de forma figurada, a essência do trabalho
de Herzog. O olhar virgem, a busca pelo novo, por imagens nunca vistas irão
acompanhar grande parte de seus filmes. E é nesse contexto que Lúcia Nagib vai
basear seu livro Werner Herzog, O Cinema
como Realidade.
Lúcia
Nagib nasceu em São Paulo no ano de 1956. Na época em que escreveu o citado
livro, era assessora da Cinemateca Brasileira e crítica de cinema e literatura
da Folha de São Paulo. Traduziu para o português um dos livros de Herzog, Caminhando no Gelo.
Em
Werner Herzog, O Cinema como Realidade,
Lúcia conta, a princípio, um pouco da história do cineasta alemão. Werner
Herzog passou sua infância nas montanhas do interior bávaro, quase que isolado
da vida urbana, tanto que veio falar ao telefone pela primeira vez aos quinze
anos. Apesar disso, em entrevista dada à autora, afirmou “não ter qualquer
experiência rural ou de relação direta com a terra”.
Mais
adiante somos apresentados a um Herzog experimentalista. Seus trabalhos
iniciais serviram de laboratório para o que viria pela frente. O cineasta
alemão produziu alguns curtas e médias-metragens entre 1965 e 1970. Entre eles,
Lúcia destaca o Últimas Palavras, curta-metragem
rodado nas ilhas de Creta e Sinalonga, na Grécia, que mostra alguns personagens
imóveis diante da câmera repetindo as mesmas frases ininterruptamente. Em seus
trabalhos iniciais a repetição é um fator predominante, tanto das imagens, como
também dos sons.
O
primeiro longa de Herzog foi Hércules,
feito entre 1962 e 1965, que mostra halterofilistas exibindo suas musculaturas
durante seus treinamentos. Mas dentre os primeiros longas realizados por
Herzog, destacam-se Fata Morgana e Os Anões também começaram pequenos. São filmes nos quais o cineasta
explorou ao máximo sua criatividade e originalidade, fugindo assim do lugar
comum das produções comerciais.
Herzog
e a miragem
Começa
o filme. Na primeira cena, um avião pousa lentamente. Quando,
enfim, consegue tocar o solo, a cena é cortada de forma brusca. Através do mesmo enquadramento, presenciamos outro pouso, tão “rápido”
quanto o anterior. A aeronave toca a pista e, mais uma vez a cena é cortada. Para
desespero do espectador, surge outro avião. Enfim, ao todo, a situação se
repete oito vezes. Este é Fata Morgana, um entre tantos outros filmes polêmicos de Werner Herzog.
Lançado
em 1970, é um misto de documentário e ficção. Seu título significa miragem. Na verdade, algumas cenas do
filme parecem grandes miragens. A princípio, Herzog queria rodar uma ficção
científica, mas ao iniciar as filmagens, jogou fora o roteiro. Literalmente. O filme
não tem um enredo definido, fugindo assim à estrutura narrativa. Segundo Lúcia
Nagib, Fata Morgana se destina,
pelo menos num primeiro momento, à fruição sensível, como a que exige a
execução de uma peça musical. Diante disso, o uso da imagem aliada à música
é essencial na obtenção do efeito desejado.
O
filme é dividido em três partes: Criação, Paraíso e A Idade de Ouro. Ele é
narrado por Lotte Eisner, uma cineasta alemã pela qual Herzog nutria na época
grande admiração.
Influencia romântica e brasileira
Segundo
Lúcia Nagib, Herzog é considerado o cineasta mais romântico da nova geração do
cinema alemão, pois retomou obras do auge do romantismo daquele país. Seu filme
mais conhecido, O Enigma de Kaspar Hauser,
é um bom exemplo disso. Ele foi inspirado no livro de Anselm Von Feuerbach,
feito em 1832, que relata a história do Jovem Kaspar. Apesar da postura
romântica ser uma característica da juventude, Herzog procura desmistificar a
idéia não abrindo, na maioria de suas histórias, espaço para personagens
jovens.
A
obra de Herzog também sofreu influencia do cinema brasileiro. O Cinema Novo nos
anos 60, com os filmes dos cineastas Ruy Guerra e Glauber Rocha, serviram de
inspiração para o alemão. A busca por uma identidade, a luta contra o
conformismo e a descoberta da própria realidade, foram pontos em comum
compartilhados pelos cineastas dos dois países. A admiração pelos brasileiros
foi tamanha que Herzog convidou Ruy Guerra para desempenhar um papel de
destaque em Aguirre (1972).
Participação de Ruy Guerra no filme Aguirre (1972) |
Entrevista com o cineasta
Mais
adiante, Lúcia apresenta a entrevista que realizou com Herzog no dia 05 de maio
de 1986. Nela, o cineasta revela detalhes de sua infância, fala sobre seu
contato com a natureza, além da paixão pelos esportes, inclusive o futebol.
Fala de sua atitude em relação à crítica de cinema e também de sua amizade com
Glauber Rocha.
Enfim, este é o Herzog apresentado por Lúcia Nagib. Concluo o texto com uma de suas frases proferida durante a entrevista, que o retrata muito bem:
“Eu não sou
nenhum artista, sou alguém que trabalha, isto é, arte não existe no meu caso,
apenas trabalho”.
Trailers:
Referência
bibliográfica
NAGIB, Lúcia. Werner Herzog: O Cinema como Realidade /
Lúcia Nagib. – São Paulo: Estação Liberdade, 1991.
Psicologia da comunicação: Houldine Nascimento; Wanderley Andrade
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