segunda-feira, 6 de agosto de 2012


Muito Além do Jardim Botânico – Texto 5


Debatedora: Kácia Guedes     
Graduanda em Comunicação Social/ Jornalismo da UFPE

            Como dizem, antes de falarmos sobre qualquer assunto, temos que o conhecer bem para que nossos comentários tenham fundamento.  Nos textos anteriores, vocês puderam tem uma boa noção do que é exposto no livro “Muito Além do Jardim Botânico”, de Carlos Eduardo Lins da Silva.  A obra lançada em 1987 foi um marco nos estudos de recepção até então feitos na área comunicacional.  O autor se destaca por sua inovação teórica, pela singularidade do objeto de pesquisa e pela ousadia do referencial metodológico.

            As referências teóricas utilizadas por Silva (1987) basicamente se apoiam na afirmação de que o público não é tão passivo como se pensava antes. Algumas pesquisas feitas até 1985, afirmavam que a audiência era totalmente manipulada pelos meios de comunicação. Em outras, geralmente feitas pelos próprios produtores de notícia, os meios de comunicação não exerciam nenhuma influência sobre as pessoas. A partir da análise de dois grupos de trabalhadores de diferentes regiões do país – Nordeste e Sudeste -, o autor pôde demonstrar que os cidadãos possuíam sim senso crítico, mas com intensidades diferentes, devido à maior ou menor interação com outras fontes de notícia e sindicatos.

            Um ponto importante de ressaltar é que o próprio autor afirma não “utilizar” a neutralidade científica em sua pesquisa. Dessa forma, ele confessa que o seu posicionamento político não é afastado do trabalho, mas explica ser algo que não deturpa a realidade dos fatos observados.

            Outra obra sobre estudos de recepção bastante interessante é o livro “Juventude e Televisão”, de Isabel Travancas, lançado em 2007. Ao invés de trabalhadores, a pesquisadora analisa estudantes universitários do Rio de Janeiro. Apesar do grande intervalo de tempo entre as publicações, podemos observar tanto semelhanças quanto diferenças entre as pesquisas. 









                             
           Dentre as diferenças, podemos citar que o grupo analisado por Travancas (2007) possui um maior senso crítico do que o de Silva (1987), devido ao maior acesso à informação.  Durante o período de observação dos trabalhadores, a televisão era quase seu único meio de informação. 

            Dentre as semelhanças, o Jornal Nacional foi o objeto principal de pesquisa em ambos os trabalhos e houve a afirmação mútua de que quanto menor os recursos financeiros e o nível de alfabetização, maior o peso da televisão na vida das pessoas.

            Isabel Travancas é mais otimista em relação ao telejornal pesquisado do que Carlos Eduardo.  Isso pode ser explicado pelos diferentes contextos históricos das pesquisas. Em 2007, o JN já estava bem consolidado e sem grandes erros nem manipulações tão escrachadas como os que ocorriam em meados de 1985, ano de pesquisa do autor. Naquela época, o telejornal ainda era muito associado à imagem de regime militar e omitia algumas informações. Não que atualmente não o façam, mas antes, acreditamos que foi mais perceptível.

            O assunto “indústria cultura” é amplamente abordado em “Muito Além do Jardim Botânico" e existem alguns pontos que precisam ser observados. Segundo o autor, os bens culturais também são fabricados em série como os demais produtos, mas existem contradições nas relações de trabalho e no produto final, ao contrário das indústrias apenas de bens materiais. As contradições existem tanto no momento da produção como no da recepção. Assim, esse nem representa uma manifestação monopolítica da ideologia burguesa, nem é consumido pela audiência de forma uniforme e passiva.

            Outra explicação muito interessante é quando o autor releva que é através da indústria cultural que a hegemonia de uma classe sobre as outras se mantém e para que seja realmente efetiva é necessário que haja espaço para a expressão de pensamentos conflitantes. Por esse motivo, as contradições entre a indústria cultural e o Estado são apenas aparentes, pois no final das contas são liderados pela mesma classe social.

            “O Estado converte-se em instituição-chave de defesa das classes possuidoras e de controle das classes subalternas” (SILVA, 1987, p. 24).

            Tal afirmação recorda de maneira bem sutil a obra de Louis Althusser - Ideologia e Aparelhos Ideológicos de Estado (notas para uma investigação) - em que ele trata dos instrumentos de dominação do Estado: instrumentos ideológicos e repressores.

            A diferença entre os dois autores é observada quando Silva (1987) afirma que a influência da indústria cultural supera a da Igreja, a da Escola e começa a superar a da Família, ao contrário de Althusser, que afirma ser a da Escola a influência preponderante. Essa divergência pode ser facilmente explicada analisando o contexto histórico dos autores.

          A partir da obra utilizada como referência para esse trabalho, também fizemos alguns questionamentos em relação à mídia televisiva atual. Silva comenta que a audiência de um telejornal se dá pela abrangência geográfica e pelo fluxo de audiência e não pela qualidade do conteúdo, fazendo supor que não existiam muitos programas de alta qualidade em conteúdo durante o período de análise. Mas e hoje? Podemos dizer que o antigo quadro mudou? Deixo a pergunta para a reflexão de todos.

            O livro “Muito Além do Jardim Botânico” é uma importante obra para analisarmos os avanços, as estagnações e os retrocessos da mídia brasileira, assim como as reações da população do período estudado e da atualidade. Será mesmo que estamos sendo telespectadores mais atentos à programação? Ou continuamos alienados pela “agenda setting” criada pela televisão brasileira?


           Quem está com a razão? Existe resposta para esse questionamento?

Nenhum comentário:

Postar um comentário