quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Muito Além do Jardim Botânico - Texto 2


            Por Tamíz Freitas
Graduanda em Comunicação Social – Jornalismo, pela UFPE.

            “Deu no Jornal Nacional”, essa frase é vista pelo autor como artifício “para dar foros de verdade e prestígio a um assunto qualquer” (SILVA, 1985, p. 92). Certamente ela não é desconhecida para nós atualmente, mesmo sendo muito utilizada há mais de duas décadas. Mas afinal, o que o Jornal Nacional representa para a sociedade brasileira? Será que ele é endeusado pela classe trabalhadora do país? Bem, nessa tese, Carlos Eduardo traz considerações sobre esses questionamentos, a partir do comportamento de trabalhadores e seu espírito crítico em relação à TV. Colocarei a seguir: metodologia, análises e observações sobre as fontes de senso crítico dos meios de comunicação.
            Silva se exime de um discurso com ‘falsa neutralidade’ acerca da metodologia, pelo contrário, afirma claramente que possui princípios políticos. Complementa dizendo que se disfarçasse isso, agiria semelhante à burguesia, classe que impõe suas exigências à sociedade. Compara o uso desse discurso ao que é feito nos noticiários televisivos, sobre uma realidade estanque. Por fim, admite que “a neutralidade da pesquisa científica só existe no nível do discurso” (SILVA, 1985, p.67).
            Foi utilizada a pesquisa-ação, para chegar a respostas mais fiéis, a partir de mais interação e inserção nos grupos estudados. Os bairros observados foram: Lagoa Seca – RN e Paicará – SP, no período de 1979-1983. Segundo o autor, esses moradores eram retrato de uma realidade bem específica no País, porém complexa. Os dois locais eram próximos culturalmente, entretanto, o bairro do RN era menos organizado socialmente do que o de SP, devido à inexistência de contato daquele com certos agentes sociais.
            Semanalmente falavam sobre o problema dos jornais e a programação da TV. Fez encontros com militantes sindicais e de partido político. Também entrevistou funcionários do JN no RJ, para compreender as condições internas de produção. No início, a análise seria do bloco das oito na íntegra, incluindo o Jornal Nacional, a novela e os intervalos comerciais. Mas devido à variedade de interpretações acerca dos dois últimos, o foco passou a ser somente o JN, o qual estava mais relacionado ao jornalismo, área de formação do pesquisador.
            Desde o período inicial da pesquisa, algumas observações já puderam ser feitas da relação entre os trabalhadores e a televisão. Uma delas foi a de que a TV era uma instituição social vista de maneira similar em ambas comunidades e que, particularmente, a Globo tinha notável hegemonia. Para compreender melhor o contexto vivido na época, o autor cita alguns dados:

(...) A começar pelo tipo de programação consumida: em 1980, na cidade do Natal, a Rede Globo era a única emissora comercial a ser captada pelos telespectadores (a única concorrência, portanto, era da TV-Universitária do Rio Grande do Norte, cuja audiência não conseguia roubar nem um ponto de IBOPE da Globo) e tal situação permanecia inalterada em dezembro de 1983; em 1981, no Paicará, embora a Globo enfrentasse a concorrência comercial da TV Record (que, nos domingos, graças ao Programa Sílvio Santos, tinha boa audiência no bairro), além da representada pela TV-2 Cultura, do Estado (que, a exemplo da TV-U de Natal, não consegue ultrapassar um ponto de audiência), a maioria absoluta dos telespectadores sintonizava a Globo quase todo o tempo (...) (SILVA, 1985, p. 82)

            O autor notou através desses dados que a “televisão era sinônimo de Globo” e que, de modo geral, era recebida de maneira positiva pelos moradores de ambas comunidades. Isso acontecia, segundo ele, pelo fato da mesma se constituir como uma importante fonte de diversão e entretenimento. Para muitos, a TV era mais do que um mero passatempo, mas também importante fonte de aprendizado. Algumas mulheres também a utilizavam como objeto de reflexão de suas vidas, a partir das novelas. Esse endeusamento pela ‘caixinha luminosa’, que transmite imagens, correspondia à realidade da maioria dos observados, que só dispunham da TV para se informarem. Mas antes que pensássemos que o aparelho era encarado como fonte inquestionável da verdade, o autor já coloca que essa aceitação “não é nem universal nem absoluta” (SILVA, 1985, p. 83).
            Ainda que muitos pesquisadores defendessem o pensamento oposto, Silva percebeu que os efeitos da TV sobre os trabalhadores não eram tão devastadores assim, visto que eles apresentavam senso crítico em relação à mesma. Por exemplo, tinham preferências sobre os tipos de notícias que consumiam. E mesmo sendo a principal fonte de diversão dos moradores, a televisão sofria concorrência de certos agentes sociais, como foi descrito pelo autor:

(...) Ela concorre com uma série de outras atividades culturais, nas quais – inclusive – as pessoas não são apenas espectadores, mas também atores. Na Lagoa Seca, há o bate-papo com a vizinhança, o aperitivo no bar, as visitas familiares, as festas populares (das quais as juninas são as mais apreciadas), para as quais a TV muitas vezes cede seu espaço, embora por vezes não totalmente. (...) No Paicará, há o bar, o bilhar, as visitas, as casas de forró e, para os economicamente mais afluentes, o rádio-amadorismo (...) (SILVA, 1985, p. 86)

            Já no quesito informação, tinha menos concorrentes. Poucos recorriam ao jornal e ao rádio. Muitos complementavam suas informações a partir de amigos. Entretanto, ele ressalta que a televisão e o telejornalismo não eram vistos como verdades absolutas. A forma mais simples pela qual os moradores questionavam os telejornais era pela comparação entre o que era veiculado e o que era visto “na vida real”, no dia a dia deles. Outra maneira que também se percebeu a criação do senso crítico foi pela aversão às retificações durante a edição do JN. Os líderes das comunidades foram desde o início mais aptos para desvendarem as ideologias da TV.
            Em relação à programação da TV, Silva percebeu que o machismo estava presente quando os homens criticavam as mulheres pela atenção dada às novelas e não aos telejornais, esses com mais prestígio. O JN, como foi dito anteriormente, tinha enorme força de persuasão, além do poder de agenda setting perante a sociedade.
            A ação de outros agentes sociais sobre as pessoas é vista pelo autor como uma das principais formas de desenvolver o senso crítico em relação à TV. A versão que é veiculada pelo agente social mais próximo do cidadão é mais fácil de ser aceita. Ele destaca algumas: Fontes Interpessoais: tipo mais comum (família, amigos); Igreja: a católica, em especial no Nordeste; Movimento Sindical; Partidos Políticos; Outros meios de comunicação de massa e Movimento feminista: o mais ativo movimento social no Brasil, desde o final dos anos 70. Conforme Silva (1985, p.96), quanto mais forte a ligação com esses agentes, mais apto o indivíduo estará para desenvolver o seu senso crítico em relação à mídia.      
            O autor até admite que as matérias possam conter algumas formas de manipulação: edição de vídeos, escolha de fontes, forma de escrita, divisão de tempo dado às fontes. Mas ressalta que isso não ‘dominaria’ a mente do indivíduo que tenha contato com os agentes sociais, anteriormente citados. No vídeo abaixo, em entrevista concedida ao programa Jogo de Idéias, Carlos Eduardo fala um pouco mais sobre essa temática, além de comentar também sobre a ‘possível’ manipulação ocorrida no polêmico debate feito entre Lula x Collor, para as eleições de 1989.

Trechos da entrevista feita sobre o tema “Jornalismo e Poder”, promovida pelo Itaú Cultural, no programa Jogo de Idéias. Além do autor Carlos Eduardo, também participaram Francisco Wianey Pinheiro, Bernardo Ajzenberg e Claudiney Ferreira, o mediador. Para ter acesso a entrevista na íntegra, acesse:

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